terça-feira, 24 de julho de 2007

página 10

Sinto me um António Variações, esse é que era um génio para o seu tempo, estou bem a onde não estou e o resto é sempre uma simples contradição, contradição essa que me constrói e a nós todos. Realmente, ando desorientado, vou direitinho para a cama e só amanha é que ouvem falar de mim.
Toca o despertador, sete horas, ai tão cedo, não acredito, quero dormir, o despertador continua a tocar num tom desenfreado e eu mal conseguia abrir os olhos, mas no meio de um nevoeiro visual almejei o despertador e estiquei-me ao máximo, segurei-o dois segundos e mandei-o contra a parede, o estrondo foi enorme, mas valeu a pena, o despertador silenciou-se e eu silenciei-me.(Trim, Trim, Trim), ai possa! Mais barulho! Levanto-me em ira directamente para o telefone, atendo, do outro lado uma voz masculina azedada e pronta a me acordar sem ter vontade nenhuma de voltar a dormir, era o meu chefe, então? Que se passa? A faltar ao trabalho e nem avisas?Eu a faltar? Sim tu a faltar, hoje é segunda-feira! Ou mudaram-te o calendário aí em tua casa? Ei pois é….fiquei mais desconcentrado do que já andava, é que eu anteontem tive um acidente! O que? Tiveste um acidente, estás muito magoado? Oh Fernando, tu já me conheces à bastantes anos, eu não tolero mau profissionalismo, mas, neste caso e sendo tu, falavas comigo e eu ajudava-te, até porque eu já passei por isso, ai sim? Sim…mas a culpa não foi minha, despachou para canto de forma apressada, então sendo assim o chefe não se importa que eu falte hoje? Não rapaz, estás à vontade, dou-te uma semana para te recompores, agora não te atrevas é a faltar na segunda, que tens aulas de condução para dar.Está certo, então até segunda-feira.Ah Fernando só mais uma coisa, veja lá o que tem o seu telemóvel, que estou farto de telefonar e não dá sinal.Do outro lado não ouvi mais nada, se não o som do telefone que irrita mais que um despertador barulhento, contundo não vou mandar isto também contra a parede, pelo menos por agora.Pouso o auscultador de uma forma pensativa, porque será que o meu telemóvel não funciona direito? Pus-me a procurar pela casa toda, são papeis para o ar, são sofás praticamente a fazer o pino, sou eu a colocar o nariz entre o pó para ver se o encontro, em desespero olho para a janela e ao ver o meu reflexo iluminado por um relâmpago, lembrei me, estava no carro! Vou busca-lo, espera não vou nada, não volto a conduzir, sou praticamente um assassino, ai como estará a mulher? Será que morreu? Vou telefonar, não, não vou nada, preciso de ter calma, vou me sentar no meio de esta pocilga, ver um bocadinho de televisão, dar lhe uso porque se não, não vale o custo.Ligo a TV e um trovão dá de si, eu saltei no sofá, não é que eu tenha medo de trovões, tenho é receio.Ai este tempo, pleno verão, não dá mesmo para entender, se calhar nem é para entender e ao dizer isto passo a mão pela cabeça de forma a me encostar para trás como se estivesse a ganhar algum balanço.RTP, programa estúpido, RTP 2 publicidade, RTP 3 não existe, já estou a inventar, SIC programa estúpido, tvi programa estúpido, possa tanto canal e tudo a dar o mesmo?bem, deixa me ficar pela RTP 2 pode ser que de algo menos estúpido que nos outros canais, isto é pena é não dar desenhos animados, bem deixa me ver isto e encosto os pés em cima do sofá um de cada vez, ficando assim deitado, começa um programa sobre as regiões do interior, espera lá que isto interessa-me, digeri todas as palavras durante cinco minutos, de olhos fechados já as ouvia como uma melodia e sem imagem eu me tranquilizava.Um estrondo enorme se fez notar partindo a minha janela foi um relâmpago que me entrou pela casa a dentro, entrei em pânico, tinha a casa a arder, estava encurralado, tinha apenas a janela com uma boa possibilidade para sair, ai eu não quero morrer, que alguém me ajude, eu em ultima hipótese saltei mesmo a janela, cai e nunca mais via o fim da queda, pedi a deus ajuda!Caí…do sofá, era mais um sonho ou melhor pesadelo, isto está a ficar incontrolável.Tenho que ir a um psiquiatra, vou telefonar à minha irmã…não atende, deve estar a dormir na cama de ouro, eu também dormia se o meu primeiro marido me deixasse tanto dinheiro, mas nem eu gosto de homens, nem em Portugal se pode casar, homossexualmente falando.Bem, parecendo que não já são 11:26, que é que vou comer hoje?

segunda-feira, 23 de julho de 2007

página 9

Mais confusão, mais trabalho, mais barulho e a minha cabeça a estourar. Já não bastava aquilo no hospital, agora tenho que ir não sei onde. Bem vou ligar para a polícia, devo ter o número algures.
- Estou!
- Quem fala?
- É o senhor Fernando Guedes, o do acidente de ontem.
- Ah! Sim, sim.
- O meu carro?
- Não se preocupe, até porque já não há muito a fazer, só tem que accionar os papéis do seguro, de resto o carro está na sucata.
- Ok, obrigado
- Passe bem.
Meu Deus, quase matei uma mulher, desfaço o carro, que falta mais. Porque, porque, agora chove. Deixa-me correr até à paragem. Cada vez chove mais e mais. Fogo. Agora quero é ir para casa. Que Mundo, quero lá saber do carro, que raiva. Bem mas vou andar de autocarro, vamos lá ver o que se encontra. À entrada um motorista de bigode e uma velha rabugenta a queixar-se da vida. Sento-me, ouço o autocarro a estremecer uma vez, e já estou a dormir. Chego a casa, e ponho-me sentado à janela a pensar. Mas que dia, quase mato a pobre da mulher, quase me matam a mim, matam o meu carro. É nestes momentos em que nos deparámos tão de perto com ela, que sentimos o verdadeiro medo de morrer. Eu pelo menos, adoro viver, mesmo que não seja feliz todos os dias, mesmo que me corra tudo mal como hoje, prefiro mil vezes viver. Tenho pavor da morte, não quero morrer, não, não me deixem fechar os olhos para sempre, não parem o meu coração, deixem-me viver. Onde estou? Que sítio é este? Aparentemente é um cemitério, caminho por entre campas sem nome, cruzes e mais cruzes, ao fundo, duas campas estão em realce. Aproximo-me. É a campa dos meus pais, as lágrimas vêm, uma voz chama-me vindo não sei de onde, tudo gira à minha volta, de repente apenas uma cruz no meio do nada. Uma tabuleta dizia “António Guedes”, grito, corro, as campas voltam a aparecer, os mortos levantam-se, eu tento fugir, correndo para uma voz que me chama...
Ahah! Estava a sonhar, e a voz que me chamava era da minha vizinha que me estava a chamar para me ir deitar na cama, porque ali não estava bem.
Este sonho deixou-me assustado, que quererá dizer?